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2 de outubro de 2010

A morte do Mar Morto

Desde os tempos bíblicos a Palestina sempre foi uma área conflagrada por conflitos étnicos e religiosos, muitos deles também motivados pelo acesso à água, um bem escasso naquela parte do mundo. Com efeito, são poucos os rios que drenam a região, cujos desertos tendem a ser sua marca registrada.  Um deles, o Rio Jordão, além da importância bíblica, também é a principal linha da vida para dois países de jure, Israel e Jordânia, e um de facto, a Palestina. Graças às suas águas e aos de seus tributários, Israel consegue manter uma agricultura produtiva e saudável na Galiléia. Para garantir a qualidade e, sobretudo, o acesso desimpedido ao rio, o Estado Judeu ocupa até hoje as colinas de Golã, juridicamente pertencentes à Síria, mas onde muitas das cabeceiras do Jordão têm origem. À medida em que corre na direção sul, o rio em que João batizou tantos cristãos, vai perdendo água para a irrigação de lavouras ao tempo em que vai ganhando dejetos industriais, habitacionais e recebendo de volta das lavouras líquidos misturados com o excesso dos produtos químicos utilizados na agricultura. Apesar disso, ao chegar no Mar da Galiléia, o rio ainda está razoavelmente saudável. Entre este grande lago e o Mar Morto, contudo, o Jordão acaba por perder tanta água limpa e a ganhar tantos rejeitos que desemboca no Mar Morto sem volume suficiente que permita manter inalterados os níveis desse corpo d’água que é na verdade um grande lago de águas salgadas com 80 km de comprimento por cerca de 18 km de largura. Desde que a ONU criou o estado de Israel e a Palestina em 1948, o Mar Morto teve sua superfície reduzida em mais de um terço, com consequente rebaixamento do espelho d’água. Localizado 411 metros abaixo do nível dos oceanos, o Mar Morto é também o ponto mais baixo da Terra. Não tem a menor necessidade de ficar ainda mais baixo. Para a economia do futuro Estado da Palestina essas são péssimas notícias e não estamos falando apenas das consequências negativas para a agricultura. A redução da descarga do rio Jordão e a queda da qualidade da sua água também começam a cobrar um preço alto à saúde ambiental do Mar Morto, uma das principais atrações turísticas da Palestina. Como se sabe, o Mar Morto é de uma transparência cristalina, mas suas águas contêm vinte vezes a quantidade de bromínio, quinze vezes mais magnésio e dez vezes mais iodo e sal do que normalmente existem nos oceanos. Essa combinação dá ao Mar Morto uma consistência pesada, quase gelatinosa, que causa grande flutuabilidade. De fato, é quase impossível afundar no Mar Morto. Por sinal uma das atividades mais apreciadas por lá é deitar-se de costas nas suas águas e passar horas a fio lendo os jornais ou um bom romance. Fora isso, a mulherada aflui em grandes grupos aos spas localizados em suas margens em busca da lama de seu fundo, cujas propriedades são benignas para a pele.   Mas como um Estado em processo de nascimento pode resolver problema tão grave, sobretudo, quando não controla às águas a montante do Mar Morto? Não pode. Felizmente, contudo, Jordânia e Israel também estão sendo afetados pelo mesmo problema e já começam a estudar possíveis soluções. A primeira delas, defendida por muitos em Tel Aviv, é um mirabolante plano de transposição das águas do Mar Vermelho, com aproveitamento simultâneo do desnível de quatro centenas de metros para gerar energia. A segunda, mais sensata e menos dispendiosa, é levar as autoridades dos três países à mesa para discutir medidas sustentáveis da gestão das águas do rio Jordão, melhorando a qualidade de suas águas e controlando a descarga de acordo com as necessidades observadas no Mar Morto.

O mar morto visto de cima. Ele depende da saúde do rio Jordão para não baixar ainda mais. (foto: Pedro da Cunha e Menezes)




















O fato de que árabes e israelenses planejem sentar para discutir o bem estar comum de forma consesuada é por si só uma boa notícia naquela região conflagrada. Se o meio ambiente for o motor de alguma forma de paz, por menor que seja o passo dado, já será um progresso a ser aplaudido. O problema é que, dada a História da região, as perspectivas de entendimento beiram o impossível, Por outro lado, Jesus ressuscitou ali próximo. Quem sabe, ele não dá uma mãozinha para que o Mar Morto seja recuperado antes de fazer jus ao seu nome?


Eco é um site de jornalismo ligado no meio ambiente. 




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